Vergonha

A mordida não chegou a ser dada. Percebi de relance ao término do meu rápido percurso.

Até o fatídico momento acreditava fazer parte de uma missão. Secreta para mim e de grande importância para a humanidade. Aguardava, junto com minhas companheiras, o momento de ser requisitada e entrar em ação. Bastava um gatilho. Não o mental, mas o físico, para me impulsionar.

O tempo de espera foi mais longo que o da ação que subitamente foi deflagrada. Passei por uma espécie de túnel e fui arremessada. Senti que uma parte de mim ficou para trás e a outra irrompeu para frente a uma velocidade incrível! Confesso que até então foi muito emocionante.

Subi e em seguida fui perdendo altura. Na descida, impactei com algo que foi se dilacerando e, violenta e assustadoramente, fui destruindo tudo que estava à minha frente e ao meu redor, provocando muita dor. Foi quando tive a consciência de que aquele propósito que me determinaram não era o meu.

Em questão de segundos, minha rápida trajetória de inutilidade e vergonha deixou um saldo de um corpo estirado na calçada; a poucos centímetros, um cachorro-quente desfeito no chão; e eu, alojada na carrocinha do vendedor.

Mais um caso de polícia que deverá descobrir o autor da bala perdida… ou não…