cinquentona

A vizinha

Aos sábados pela manhã Jurema, uma linda mulher com a idade de aproximadamente 50 anos, passava em frente a minha casa desfilando seu belo sorriso e corpo perfeito. A moça tinha uma postura diferente das amigas de minha mãe. À medida que caminhava ao longo da calçada todos a olhavam com respeito e admiração. Eu devia ter uns dez anos, meu pai me deixava aspirar a Kombi que ele possuía, era uma festa! Ligava o som alto e me divertia bastante, diga-se de passagem. Só assim conseguia ficar na rua, pois de outro modo estaria dentro de casa ajudando minha mãe nos afazeres domésticos. Por isso sempre via Jurema passar, que me piscava os olhos em sinal de aprovação ao meu divertimento e trabalho. Ficava encantada com a beleza da VIZINHA. Em casa todos a achavam muito bonita e simpática, senhora de um sorriso lindo com dentes branquinhos, muito bem maquiada e penteada, seus cabelos pretinhos de henê brilhavam ao sol (na época as mulheres usavam henê para alisar os cabelos, não havia progressiva ou outra química). Como dizia, seus cabelos muito bem arrumados a tornavam ainda mais bela. Normalmente usava calças comprida e blusa social, sapatos de saltos altos combinando com a bolsa. Sempre comentamos sobre sua beleza e simpatia.

Minha mãe não trabalhava fora de casa. Eu a ajudava com os dois irmãos, uma irmã com sete anos e irmão com quatro. A diferença de idade entre nós é de três anos. As idas à rua eram sempre por minha conta. Inclusive era quem levava os recados recebidos para os vizinhos, pois na ocasião éramos os únicos com telefone em casa. Havia orelhões no bairro, mas quase nunca funcionam, seja por defeito ou vandalismo. Mas o fato é que em certos momentos ficava estressada ao ouvir o toque do telefone doméstico e torcia para não ter que sair correndo para levar recados. Foi assim que em um belo dia o bendito tocou. Minha mãe atendeu e me chamou para ir a casa de uma das vizinhas levar o recado e que não poderia demorar pois a pessoa iria ligar novamente para saber o que seria decidido.

Saio correndo até a casa de Dona Sinhá (mãe de Jurema), chamo, chamo, chamo no portão, bato palmas insistentemente até que uma mulher aparece toda molhada perguntando sobre o que se tratava. Ela estava irritada com tanto barulho, mas não tinha outro jeito porque a casa não tinha campainha. A mulher me chamou pelo meu nome mas não a conhecia, ou pelo menos achava que não.

– Fala, Dulce! O que deseja?
– A senhora sabe meu nome? – Perguntei e imediatamente. Ela me respondeu:
– Claro! Acabei de te ver no portão da sua casa enquanto limpava o carro do seu pai. Como não iria te reconhecer menina? Sou Jurema!

Meu mundo caiu!!! Imaginem. A mulher que vi horas atrás tinha dentes, seios empinados, bumbum no lugar, que brincadeira era aquela? À minha frente tinha uma banguela, com camisola de tecido e botões, um saco na cabeça, rosto pálido, toda desconjuntada, não poderia ser a minha musa!!! Não, não!

Saí correndo pra casa sem dar o recado. Esqueci completamente. A mulher gritou “o que estava acontecendo?” mas eu simplesmente corri. Ao chegar em casa o telefone já estava fora do gancho e minha mãe perguntou “o que Dona Sinhá respondeu?” Virgem Maria. Se eu não falei nada também não tinha resposta. Minha mãe estava impaciente e eu meio tonta devido ao susto respondi, “mamãe, não vi dona Sinhá, não falei com ela”. Corri para o quarto. Queria falar com alguém mas minha mãe não seria a melhor pessoa. Jamais aceitou fofocas ou comentários sobre a vida dos vizinhos, Fiquei quietinha no canto sentada até que mamãe apareceu na porta preocupada perguntando o que aconteceu? Por que estava tão esquisita? Falei sobre o ocorrido e pela primeira vez não levei bronca, mas ela não acreditou em nada do que disse por parecer impossível aquele mulherão ser como a descrição que fiz!