supermercado

Nem sempre são as melhores, mas não saem da cabeça

Já passava das cinco da manhã quando Marcos entrava pela porta dos fundos, tentando ser o mais madrigal possível, mas a voz embargada e rouca lhe deixa dúvidas em seu estado, que por sinal muito insólito, diga-se de passagem, Poty, ao notar a presença do dito cujo, esbravejou esses lençóis da Teka são novos, foram comprados nas Pernambucanas. Ao terminar seu discurso entredentes notou algo errado. Lá estava Marcos enrolado nos lençóis cheio de vômitos, pra desespero de Poty, que não se fez de rogada. Chamou Gessy, a filha caçula de doze anos

– Vai na drogaria comprar um efervescente, mas vai na popular que é mais barata.
–  Qual devo comprar? Sal de frutas ou ENO?

É nesse instante que Marcos, ainda grogue, dá sua opinião e traz sabor limão. Gessy sai as pressas pra fazer a compra do remédio. Poty, muito puta da vida, avisa;
– Assim que melhorar dessa cachaça você vai no mercado comprar sabão pra lava essa roupa de cama cheia de vômitos e outras coisas. E assim foi feito. Ao sentir que seu estado já lhe possibilitaria ficar de pé, Marcos foi cumprir sua missão. Chamou Harley Davidson, seu filho mais velho, para lhe fazer companhia ao mercado.

Poty fez a lista. Marcos nem quis olhar. Pegou e a colocou no bolso. Harley Davidson questiona:
– O que temos que comprar?

Marcos dá de ombros:
–  Sei lá! Elas pedem tantas coisas que é melhor nem olhar.

Ao chegar ao mercado, Marcos pega a lista e começa a resmungar:
– Tudo isso?

Sem saber que o pior estava pra acontecer, Harley Davidson pede pra chamar Gessy pra ajudar com as compras e assim começa o martírio de Marcos:
– Leia a lista, por favor, Gessy.
– Pão de forma, sabão em pedra, sabão em pó, refrigerante, café, arroz, feijão, etc..

A lista tinha três páginas. Marcos fica em desespero e divide a lista em três. Cada um compra uma parte e assim foram feitas e cumpridas todas as exigências de Poty. Será?

Já passavam das treze horas quando Marcos deixou o mercado. Famintos, Gessy e Harley Davidson questionam:
– Temos que ir, estamos famintos.

Marcos propôs um pit stop no bar da esquina. O semblante de Harley Davidson se iluminou. Era a oportunidade de aos dezoito anos começar sua carreira boêmia de vômitos e efervescente (na presença do pai, é claro). Mas, e Gessy? Que aos doze anos não era hora do começo, mas uma companhia feminina neste momento poderia ser essencial para que a bebedeira fosse contida. Sentados à mesa no canto do bar, Marcos pede em voz alta:
– Um refrigerante. por favor.

Logo, uma voz suave responde:
– Refrigerante não. Quero uma Coca-Cola.

Marcos, incrédulo com a preferência da filha, parte para o filho e pergunta:
– Vai me surpreender também?
– Não. Só quero uma cerveja.

Mais uma Heineken, sentados à mesa, Marcos não percebe a velocidade em que as garrafas vão se esvaziando. É quando Gessy, em um estado de gastrite aguda pela terceira lata de Coca-Cola, esbraveja dizendo que estava na hora de ir embora. Neste momento, Marcos e Harley Davidson lembram de Poty. Como podem ser tão parecidas?

Como elas são poderosas aos doze anos. Gessy consegue o que parece impossível: colocar o pai e o irmão para casa. É lá que Poty os espera ansiosamente para conferir as compras por ela solicitada. Ao chegarem, Marcos coloca as bolsas sobre a mesa, para que Poty e Gessy façam a conferência:

Sabão em Pó — Omo
Sabão em Pedra — Rio
Feijão — Máximo
Arroz — Tio João
Farinha — Granfino
Creme Dental — Colgate e Oral B
Sabonete – Lux e Palmolive
Etc, etc.

Alegria de Poty estava estampada em seu semblante. Depois de uma manhã de porre, uma tarde/noite satisfatória com as compras por ela solicitadas serem plenamente compradas com sucesso. A felicidade de Poty ficou completa quando Harley Davidson entrega uma sacola com dois quilos de contra-filé e falou:
– É para o jantar. Faz um bife à milanesa pra gente?

Poty feliz da vida fala pra Gessy:
– Filha, vai no mercado e compra uma Coca-Cola para jantamos.

Gessy, com gastrite e várias aftas na língua de tanto beber Coca-Cola fala:
– Pode ser Fanta, mãe?