Tinha vinte poucos anos e fazia faculdade à noite. Se você nunca fez faculdade particular à noite, vou te contar: todo mundo vem estressado do trabalho, paga suas próprias contas e fala de sexo o tempo todo (pelo menos o tempo todo que dá pra falar). E a gente faz amizades rápido. Eu era da galera do fundo da sala, que encontra nos intervalos das aulas e fala putaria pra se divertir. E nessa turma tinha um carinha que sempre mexia comigo. Já tinha um ano que ele me cantava, mandava indiretas e as vezes até diretas demais. Ele era engraçado e eu meio que não dizia “não”. Um dia, voltava pra casa de carona no carro dele, com mais duas amigas, e passamos em frente ao antigo Center, em Nova Iguaçu. Ali tinham três cinemas onde na infância já assisti muito filme dos Trapalhões. Hoje no mesmo letreiro que já exibiu Lua de Cristal estava sempre escrito “Dois Bons Filmes Eróticos”. André virou-se pra mim e disse:
– Cláudia, qualquer dia vou te trazer nesse cinema.
– Vai nada!
– Vou sim. Já vim aqui sozinho e meu sonho de infância é ir com você.
Rimos muito. Sonho de infância… Mas quem disse que eu esqueci do convite?
Um belo dia, estava eu de folga, curiosidade a mil, mandei mensagem pro André:
– É verdade que você frequenta aquele cinema?
– Já fui, mas não frequento.
– Tenho curiosidade de ir.
– Ué, vamos lá qualquer dia desses.
– Vamos hoje? Aproveita que eu tô de folga.
Acho que o André não tinha pensado que eu poderia aceitar. Era mais uma cantada dele que um convite. Cinco minutos depois ele responde:
– Te pego três horas?
– Beleza!
Que merda que eu fiz? Era uma mistura de tesão com curiosidade. Que tipo de gente vai num cinema desses em um dia de semana de tarde? Tem sessão? Lanterninha? Tinha arrepios no estômago só de pensar. Almocei, botei um vestido e fui. André veio me buscar. Assim que entrei no carro ele riu pra mim e disse:
– Você é maluca!
Banquei a experiente e disse:
– Que tem? Você é do tipo que acha que mulher não tem curiosidade, não vai em puteiro… (mentira, nunca fui).
André tentou disfarçar o nervosismo dele:
– Não acho nada. Você topou e vamos lá.
Estacionamos ali perto, entramos pela galeria do Center e subimos as escadas pro segundo piso. Lá no canto, depois das lojas, fica a entrada do cinema. Dava a impressão que todo mundo sabia onde a gente tava indo. André comprou os ingressos e entregou pro bilheteiro. Já morri de vergonha ali. E se ele me reconhece depois? Entramos. Sala escura, filme de sacanagem numa tela enorme e uns vultos sentados e em pé aqui e ali. Nervosa, puxava o André pra perto, morrendo de vergonha. Aos poucos, o que era vulto vai ganhando forma. Aquele ali descabelando o palhaço na terceira fila é o Seu João, vigia do colégio que eu estudei? Meu Deus! André me puxou pro meio de uma fila, bem no meio do cinema e sentamos nas poltronas ainda sem conseguir enxergar direito.
– Assustada? – Perguntou André.
– Eu não – Respondi firme. – E você?
– Confesso que nunca achei que você fosse aceitar o convite. Sempre tive tesão em você, mas trazer você num lugar desses vai além de qualquer fantasia minha.
Quis bancar a decidida e fui logo beijando ele. Pra quem me cantava tanto, eu tinha muito mais atitude que ele. E logo ele começou a beliscar minha bunda. Falei pra ele:
– Vai com calma, não precisa beliscar que dói.
– Mas eu não tô te beliscando!
Porra, tinha um cara na fileira de trás com a mão na minha poltrona. Olhei feio pra ele, mas ele sorriu e disse:
– Quando acabar quero falar com você.
– Vai procurar sua mãe pra falar, otário.
Gente, ele devia estar pensando que sou puta. Olhei em volta e a única mulher que eu vi tava na tela cercada por três caras. Devo ser maluca mesmo, olha onde eu vim parar. Mas o tesão falou mais alto. Tentei ignorar o entorno e me concentrar no André. Mas tava difícil, viu? Eu estava ligada no 220 e o André era a decepção em forma de boy. Não sabia usar as mãos, não beijava muito bem e eu que sempre tomava as iniciativas. Quando minha mão começou a descer pela barriga dele e chegou dentro das calças, em um minuto ele chegou lá. Um minuto!
– Desculpa, Cláudia. É que você é muito gostosa – disse ele.
Levantei meio puta e fui procurar um banheiro pra lavar as mãos. Lá no fundo da sala e na porta dos banheiros já era mais claro. Dava pra ver homens se pegando e pessoas sozinhas assistindo mesmo o filme. Um homem ainda me abordou na entrada do banheiro e acabou ficando com a mão suja também. Me limpei e percebi o olhar de uma prostituta que com certeza achou que eu era concorrência pra ela.
Nem fui buscar o André e já saí dali direto pra fora do cinema. Desse dia em diante esse submundo do sexo na cidade não era mais surpresa pra mim. Descobri o que acontece no banheiro de estacionamentos, no banheiro do Top Shopping e do Vianense. Ainda na saída do Center, alguém me cumprimentou:
– Tudo bom, Claudinha?
Puta que pariu. Era mesmo o vigia do colégio.
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