Suas tentativas já tinham virado uma “lenda urbana” na família. Tentava, tentava, e nada… Mas ninguém podia culpa-la de não tentar. Na sua sexta tentativa, novamente com tensão, ansiedade e toda família na expectativa, Marcela finalmente conseguiu passar na prova para ter carteira de motorista! Até os instrutores ficaram felizes, e aquele grito que estava preso na garganta dos familiares foi ouvido por todo local da prova! A alegria estava praticamente completa!
Marcela não pensava em outra coisa a não ser dirigir o próprio carro, não aguentava mais andar de ônibus, praticamente cruzando a cidade todos os dias para fazer o trajeto casa-trabalho-faculdade-casa. Era cansativo demais, era longe demais, era muito tempo perdido de sua vida.
Já tinha combinado com as amigas da faculdade que na volta para casa iria rolar aquela carona solidária, dividindo o valor do combustível, o que facilitaria a vida delas!
Ficou um ano na expectativa, aguardando passar o período para pegar a carteira definitiva. Contava os dias. Nesse tempo, juntava o que tinha e o que não tinha para dar entrada no carro. Fazia hora extra no serviço, vendia trufas na faculdade (escondida, é claro), dava aulas no final de semana de reforço para alunos no início da idade escolar. Independência era com ela mesmo! O carro seria a possibilidade que ela tanto esperava para alcançar sua “maioridade”.
Faltando um mês para pegar a carteira definitiva, foi na concessionária e escolheu o carro que tanto queria. Grande, espaçoso, para sair com seus pais e ir na casa de praia no final de semana sem problemas para levar malas, bolsas, etc.
Chegou o grande dia! A vontade era sair de casa e gritar parar que todos vissem aquele momento de glória! Seus pais não escondiam o orgulho, lágrimas escorriam de tanta emoção. Depois de um ano aguardando por aquilo, não precisaria de mais ninguém ao seu lado para auxiliar, se fosse preciso!
Escolheu a sexta feira para realizar o grande sonho, chegou no trabalho e todos, que já conheciam a história, deram os parabéns e orgulhosos até tiraram fotos dela na hora do final do expediente entrando no carro!
Chegou na faculdade mais cedo que o habitual (claro, de carro é mais fácil), mas, como era uma sexta feira, a turma não estava tão cheia quanto o habitual e apenas uma amiga, das mais chegadas, tinha ido estudar. Ficou contente que ia voltar para casa de carro, mas disse que daria o dinheiro do combustível no início do mês. Aceitou contrariada, mas aceitou. Nada tiraria a alegria dela.
Ao sair da faculdade, a amiga perguntou se podia passar no shopping rapidinho, já que elas não iriam demorar muito para chegar em casa, por causa do carro. Ela aceitou, e por volta de 23:00, partiram para casa. Como era bem prudente, não bebeu uma gota de álcool.
No caminho, as duas felizes e contentes conversando, rindo, praticamente gritando dentro do carro de tanta felicidade, não perceberam que ao entrar na avenida, estavam sendo seguidas por dois carros. Ao entrarem em um via marginal, um dos carros acelerou e passou por elas e o outro emparelhou, com o cara que estava no carona apontando uma arma para o carro e mandando que elas parassem. O desespero tomou conta das duas e ao tentar acelerar, o carro que estava na frente impediu que seguissem. O grito era de pavor quando elas viram as portas se abrirem e quatro caras armados desceram mandando que elas saíssem do carro.
A amiga desesperava, chorava e gritava pedindo para ir para casa. Os caras mandavam a todo momento ela calar a boca. Aqueles segundos eram eternos e ninguém aparecia para ajudar. As duas se abraçavam chorando até que um dos caras fala: Mata! Um único tiro na cabeça da amiga e Marcela coberta com o sangue da amiga.
Outro bandido venda Marcela e coloca dentro do seu carro, que agora tinha o cheiro do sangue da amiga. Ao chegar em um campo de futebol abandonado, eles a tiram do carro e a violentam de todas as formas e maneiras. Não havia mais força para um único grito. Sua respiração
era cada vez mais lenta, mas a dor ainda teimava em ficar em seu corpo.
O carro foi encontrado, três dias depois, em outra cidade, queimado. A lembrança que ficou com a família foi o carnê com as parcelas do carro, pois o corpo da filha nunca foi encontrado.
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