Aleatórios Fenig livro autores

Roubando tudo de todos

Todos te buscam e só alguns se acham.
Alguns te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem.
E a os que se perdem por ter achar, ó desatino.
A verdade, oh fome de vida!

Ferreira Gullar

Amar sem pensar é bem raro.
O verbo cumprir custa caro.

Cartola

Ah, como eu queria nesse tempo ter nascido mas, para o bem da humanidade, as palavras ficam e se imortalizam. Ainda bem. Mas para ser sincero, estou reclamando de barriga cheia. O que eu queria mesmo era pegar um carro bem grande, vermelho, azul e preto, com uma aranha desenhada, como aquele do Carlos Mendes há um tempo atrás e fazer um grande passeio. Levaria comigo personagens que gosto muito, tais como a Ciça do Bollmann, que descobriu a palavra instante e ficou um pouco confusa, mas logo chegou a Dandara, professora do Márcio Rufino para ajudá-la a compreender como é bom ter amigos.

Chamei um tatu que veio importado de Portugal. Patrícia Montês que me indicou. Aproveitei pra convidar o gato Miguel do Medina e o Aruanã, o peixe autista do Wagner, mas avisei pra tomar cuidado, pois peixe e gato não é uma boa combinação. A viagem seria longa, não tinha um destino definido. Chamei Seu Nilton e o Marujo para contarem umas histórias. O acordo estava difícil. O primeiro queria falar da tartaruga e o elefante, o segundo do Tribunal infantil. O impasse estava difícil de terminar. A viagem prosseguia e ao passar por Nilópolis a Nice lembra do Churrasquinho do Jorge. Aquela não era a hora de falar de comida. A barriga já estava roncando quando Anna Diamante lembra do bolo da vovó que trazia na bolsa. Que bom!  Seu Nilton pede silêncio, pois iria contar sua história e quando Lafayette dá um grito: – Aqui é Cascadura?

Adoro esse bairro! A viagem prosseguiu. Miguel não tirava o olho de Aruanã. O sol estava quente, sugerimos fazer uma votação para onde iríamos. Sem surpresa, o Tribunal infantil votou e decidiu: vamos para a praia (decisão manipulada, é claro!). Decidiram ir pra Muriqui. Alguém do grupo já teria estado lá e disse que era legal. Quem sabe encontraremos um gênio da lâmpada e faríamos um pedido de acordo com as necessidades de cada um, responde Carla Ribeiro, que a última vez que se sentiu tão apertada foi quando percebeu que havia uma placenta do lado da sua. Que absurdo!

Que passeio complicado. Todos exaltados, um calor danado, uma confusão só: Quero falar, quero falar! O tempo fecha em todos os sentidos. Parece uma família agitada. Vem a tempestade. Sem mais nem menos aparece uma vizinha misteriosa oferecendo um acolhimento. É Dona Cristina, que diz ser fã do Aleatórios, mas na última vez que esteve na cidade ficou hospedada em uma casa no Bairro de Luz. É que lá tinha um vizinho fantasmagórico e que precisava de um acerto de contas. Só depois descobriram que ele teria sido o seu primeiro amor, lá na década de quarenta, que passou a ser tricolor por sua causa. Quantas histórias. Hora de ir embora. Que dia. Apesar de confuso, não foi ruim de tudo. Já era tarde, Seu Nilton falou que precisava tomar seu remédio e lembrou da sua primeira comunhão, na Irmandade da Nossa Senhora da Conceição, na Tijuca. Que infância boa. Agora vamos! O carro do Homem-Aranha está mais para Velozes e Furiosos da Baixada Fluminense de tanta velocidade, pois a tempestade já havia passado.

A preguiça me fez fazer esse apanhado de lembranças. Peço perdão por roubar tudo de todos.