– Alô, é da polícia? Minha farmácia foi roubada. Levaram tudo!
– Calma, senhor. Estamos indo aí.
Não eram sete horas da manhã e um carro da polícia chegava à farmácia no Engenho Novo, Zona Norte do Rio de Janeiro. Cadeados arrombados e recolocados cuidadosamente no lugar. Caixa registradora intacta, mas vários remédios de marca, de uso contínuo, foram levados. Prejuízo estimado em 70 mil reais. Ao conferirem as câmeras de segurança viram três idosos praticando o furto. Uma mulher de capuz com uma lanterna ia na frente. Outro idoso de óculos bate numa bicicleta deixada na loja, resmunga e depois vai na prateleira exata onde estão os medicamentos mais caros. Anticoagulante, pressão arterial, artrose, controle de colesterol e colírios foram levados, deixando genéricos e similares pra trás. Um terceiro ladrão caminha com dificuldade e ajuda a encher sacolas com os medicamentos. Os três estavam de máscaras cirúrgicas, o que dificulta o reconhecimento. Pararam uma Fiorino na porta da loja e rapidamente saíram levando o fruto do roubo.
A polícia ainda fazia seu serviço quando chegou o carro da tevê local. Entrevistaram o dono da farmácia, o balconista e o policial:
– O comando da unidade já iniciou o contato com a delegacia da área. É uma quadrilha que realizou outros roubos na área e vamos localizar e prender os autores da ação criminosa.
Logo a reportagem foi a uma praça em frente entrevistar os moradores. A matéria ia passar no jornal da hora do almoço. Tomaram primeiro o depoimento da Dona Justina de Souza, aposentada, 68 anos:
– Achei engraçado. Falaram que eram três velhinhos, né? Roubaram Viagra também?
Logo entrevistaram o Seu Eliaquim Batista, aposentado, 72 anos, que deu entrevista sentado junto a mesa de xadrez da pracinha:
– É um absurdo. Onde esse mundo vai parar? A gente sabe a dificuldade que o aposentado passa, mas mesmo se fosse pra uso próprio, não se justifica.
Um pouco mais à frente, apoiado do lado de dentro do portão de casa, Seu Augusto Vasco Aranha, aposentado, 73 anos, também dá a sua visão dos fatos:
– O remédio tá pela hora da morte, mas é errado roubar. Eu mesmo gastando 300 reais por mês com remédio pra reumatismo e não faria um negócio desses.
A polícia foi embora, o carro de reportagem também e os três velhinhos entrevistados se reúnem no banco da praça:
– Augusto, tu não foi dar com a língua nos dentes pra moça da Globo não, né? – disse Justina com a mão nas cadeiras.
– Vê se eu sou você, Justina. Não inventa de sair com essa Fiorino da garagem não. Seu neto que vá fazer entrega pro pet shop de bicicleta essa semana – respondeu Augusto apontando a bengala para a casa da Justina.
– Vocês querem parar de discutir isso alto na praça? Vamos ter que sumir por um tempo. Justina, você que já matou dois maridos, fica esperta. Pra dar sumiço em algum bisbilhoteiro é um pulo – falou Eliaquim indo da expressão séria para a galhofa.
– Vamos dividir esses remédios e vender na encolha pro pessoal lá do Cachambi, que é pra não dar na vista – ordenou Justina – Vou ficar com a minha Losartana de marca, que genérico me dá alergia. Essa aposentadoria de merda vai toda na farmácia e esses putos já estão com o rabo cheio de dinheiro mesmo. E você, Eliaquim, vê se fica quieto quando for gastar o Viagra com as novinhas. Você tá que nem orelha de vaca: longe do rabo e perto do chifre. Tu gosta mesmo é de ficar contando vantagem, além de pagar conta pros cornos dos maridos todos aqui do bairro.
– Justina, o que você tem de velha você tem de linguaruda. Devia ter roubado Diazepam pra te dar um sossega-leão – arrematou Eliaquim saindo de banda e indo pra dentro de casa.
Justina chega perto da orelha de Augusto e diz:
– Augusto, acho que vamos ter que dar um sumiço no Eliaquim. Ele vai dar com a língua nos dentes. Odeio velho fofoqueiro!
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