Como pesquisa antropológica, fiz incursões à tribo dos Toscantis na perspectiva de entender seus rituais e participar de forma respeitosa deles, uma vez que esses rituais são a chave para entender suas motivações.
Os primeiros estudos indicavam que eles cultuam escritos ritualísticos, que adquirem em templos dedicados a colecionar esses escritos ou chegam até o seu lar trazidos por servos dessas divindades. Os Toscantis mantém em suas casas totens dedicados à coleção desses escritos, onde acumulam exemplares. Geralmente são mais admirados na medida que esses totens se tornam maiores e mais completos. Há uma grande variedade de divindades criadoras desses escritos, mas algumas possuem mais volumes e são cultuadas por mais Toscantis do que outras. Seus adeptos costumam ler esses escritos em rituais solitários que podem demorar horas e se satisfazem quando finalizam a leitura de um desses escritos. Apenas os nativos que conseguem transcrever ou criar esses escritos são considerados Toscantis de fato.
Iniciei meus estudos desta comunidade antes do grande período de isolamento. É uma tribo que não pode ser percebida por aspectos físicos, já que são muito diferentes, mas possuem características comportamentais que os assemelham e os distinguem dos seus pares. Os Toscantis têm rituais isolados, em que se trancam solitários em transe. Utilizam artefatos como varas de tintas, telas brilhantes ou caixas pretas digitais que auxiliam no ritual. Eles passam horas a fio ou mesmo intercalam períodos mais curtos onde preferem o isolamento e alternam frustração e excitação, vociferam interjeições de desaprovação. Ao expurgar seus demônios, os Toscantis saem felizes com o resultado. Eles procuram outra caixa preta que transcreve em hieróglifos o resultado do seu ritual ou se dirigem a pequenos templos onde existem caixas maiores que realizam o mesmo feito.
Periodicamente os Toscantis se reúnem em uma cerimônia para compartilhar o resultado do seu ritual individual sobre uma grande tábua onde todos os hieróglifos são depositados e redistribuídos. Durante horas escutamos seus cânticos, que são sempre acompanhados de ovações ao final. Às vezes esses rituais são acompanhados com bebidas fermentadas e comidas consagradas, mas parece que alguns locais são tão sagrados que não permitem a entrada desses acompanhamentos. A reunião se encaminha para o fim quando os integrantes expõem suas opiniões e são um por um identificados, gerando maiores ovações e explicações sobre o percurso do seu ritual individual. Ao final de cada reunião eles definem a data da próxima reunião e a temática abordada.
Confesso, ao fim desta jornada, que falhei como observador neutro: fui capturado por um deles, tive minhas anotações decifradas e, antes que pudesse escapar, ouvi a sentença definitiva de que teria capacidade de ser também um Toscanti. E assim, fui iniciado. Não sei se serei aceito. Mas já me ofereceram bebida fermentada e comida consagrada. Talvez seja a forma dos Toscantis demonstrar afeto.
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