Luiz Gama

O rábula

“LUISITO, LARGA ESSE LIVRO E VEM ME AJUDAR NA LABUTA MININO!” Assim gritava sua mãe, Luísa, uma preta alforriada, que chegara fugida da Bahia, por estar envolvida até os dentes na revolta da ‘Sabinada’.

Luisito, ainda menino, mesmo sem saber ler, tinha uma enorme atração pelas letras e figuras dos livros que encontrava pelos caminhos e, a exemplo de sua mãe, já se mostrava inconformado com o mundo em que vivia e sonhava com uma liberdade plena. Uma herança africana.

Foi vendido pelo próprio pai, quando tinha apenas dez anos. O pai era um homem de cor branca, que vivia envolvido com jogatinas e resolvera vender o filho para quitar suas dívidas.

Durante o cativeiro, em meio a distração de seus ‘senhores’, o menino aproveitava sua função em ‘ofícios domésticos’ e folheava os livros que existiam na casa, coisa que ele tanto amava fazer. Com o auxílio de um estudante amigo da família que o havia comprado, aprendeu a ler e, a partir daí, passou a ‘devorar’ os livros.

Aos vinte anos tentou ingressar no curso de Direito na Faculdade do Largo de São Francisco, mas foi recusado porque era negro e pobre. Mesmo sendo hostilizado pelos professores e alunos, lhe foi permitido assistir as aulas como ouvinte.

Conseguiu, através de suas diversas leituras, provar que tinha direito de ser livre e, a partir desse dia, mergulhou de vez nas letras, vindo posteriormente a exercer o jornalismo e fundou, juntamente com Rui Barbosa, o jornal “O Paulistano”.

Autodidata e excelente orador, Luisito passou a ser um dos maiores intelectuais do Brasil na metade do século XIX.

Após conquistar sua liberdade, passou também a ser respeitado por outros intelectuais de sua época. Durante toda a sua vida, escreveu apenas um único livro de nome “Primeiras Trovas Burlescas de Getulino”. Getulino era um dos seus pseudônimos. Foi autor também de diversas peças líricas, de reconhecido valor.

Foi um dos maiores jornalistas no Estado de São Paulo e foi também um dos maiores abolicionistas que o Brasil já conheceu. Era tido como ‘rábula’, nome dado a um advogado sem formação acadêmica. Teve muito sucesso na defesa de outros negros escravizados e conseguiu a liberdade de mais de quinhentas pessoas.

Aos 52 anos, o nosso querido Luisito nos deixava, por problemas oriundos de complicações agravadas pela diabetes. Sua importância para todos nós ficará eternamente gravada na memória daqueles que prezam a igualdade e a liberdade.

Em sua certidão de nascimento, o seu nome é grafado como Luís Gonzaga Pinto da Gama e sua mãe, Luísa Mahin. Preferiu, durante toda a sua vida, ignorar o nome pai.

Luís Gama, como ficou conhecido posteriormente, foi o Patrono da Abolição da Escravidão no Brasil. Um herói abolicionista.