Entrou cedo no restaurante. Sentou na mesa do fundo, fez sinal para o garçom. Quando ele se aproximou, levantou o queixo e foi logo falando: “Me chama o gerente?” Surpreso, o gerente chegou rápido, foi atencioso. Ela logo saiu do restaurante sem almoçar.
Cris vivia numa cidade média, monótona, com trânsito moderado e vizinhos na média. Ia de casa para o trabalho e não saia muito. Naquele dia, entrou na loja de presentes. Se balançou por entre as gôndolas, driblou a atendente e foi logo no caixa. “Posso falar com o gerente?” Esse logo apareceu, achando que Cris tinha algum produto para trocar. Cris voltou de mãos vazias assim como entrou na loja.
Dali já foi ao banco. Travou logo na porta giratória. Nem bem o segurança se aproximou dela, foi logo gritando: “Chama o gerente! Chama o gerente!” Agitação na agência, curiosos se aproximando. Assim que ela viu o gerente se acalmou e se dirigiu ao caixa eletrônico como se nada tivesse acontecido.
Mais tarde foi a vez da lotérica. “Vai fazer uma fezinha hoje, Dona Cris?”, perguntou a caixa animada. “Olha, você sabe me dizer se essa agência tem convênio com o Banco Safra?”, quis saber Cris. “Sei não. Vou perguntar ao gerente. Seu Pedro!”, gritou a caixa. “Não precisa. Mais tarde volto aqui com uns números pra jogar na Megasena. Beijo”.
Estava no dia a dia da Cris essas idas ao comércio. A vizinha já comentava, o padre já comentava, as colegas de trabalho já comentavam. Até o mendigo da pracinha sabia que não estava tudo bem. Cris até reparava, mas não ligava. Mantinha a rotina e só quebrava nessas escapadas nas lojas. Todo dia se enchia de esperança, pegava a bolsa e saia. Voltava frustrada, mas no dia seguinte saía de novo com toda a coragem e o queixo erguido.
Da última vez foi no supermercado. Cris pegou o carrinho e colocou logo 10 quilos de açúcar, a despeito dela morar sozinha com a filha. O locutor do mercado anunciava aquelas promoções do tipo “o patrão ficou maluco”. Ela se empolgou com a promoção e foi puxar assunto com o locutor: “Já chamou o psiquiatra?”, “Será que ele não fica maluco com o preço do café e faz uma promoção também?”. O locutor deu risada com a cliente espirituosa e logo deu conversa. “Qual o nome do gerente?”, perguntou Cris. “Seu Otávio!”, respondeu o locutor meio decepcionado, porque achou que o interesse era nele. Assim como já tinha feito em todo o comércio da região, Cris baixou a cabeça e saiu do mercado, deixando o carrinho cheio de açúcar em promoção pra trás.
Ninguém sabia que, dias antes disso tudo, Cris recebeu uma ligação. Era um colega da época de escola. Pegou seu contato com uma amiga em comum. Ele não sabia, mas tinha sido o crush de toda a adolescência da Cris. Aquele aluno nota 10, bonito, perfeito, legal, mas que nunca deu bola pra ela. Prodígio. Falaram um pouco sobre a vida, até que ele conta pra Cris que conseguiu um cargo de gerente na cidade dela. Assim que ele deu essa informação, cai a ligação. Cris esperou por dias que ele retornasse e nada. Nem uma dica, a não ser que ele era gerente. Só sentir uma paixão adolescente de novo poderia tirar ela dessa condição que a vida colocou.
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