abaporu

O golpe do golpe

Todos sabem do golpe aplicado pela filha de um famoso marchand de obras de arte do Rio de Janeiro que, utilizando de serviços de quiromantes, envolveu sua mãe numa trama sórdida. Ela a aprisionou em cárcere privado no fogoso bairro de Copacabana, exigindo que a mãe fizesse transferências milionárias, até que a filha e as falsas quiromantes foram descobertas e presas. Uma fortuna em obras de arte, avaliadas em 700 milhões, foram apreendidas. Quadros de Tarsila, Volpi, Pancetti, Di Cavalcanti, etc… foram descobertos na apreensão.

Aparentemente, tudo havia sido solucionado, certo? Não! As obras de arte encarceradas na polícia civil do Rio e depois devolvidas à idosa resolveram “dar o troco”. O tranquilo e calmo quadro O Abaporu, líder incontestável da gangue de Tarsila, resolveu sair de seu túmulo na Argentina após ler a reportagem no jornal El Clarín sobre o ocorrido com os quadros de seus antigos companheiros. Desvencilhado de sua moldura e disfarçado num saco de trigo, pegou o avião e retornou ao Brasil.

Entrementes, na prisão, uma das falsas videntes acordou à noite com uma forte dor em sua mão. Se tratava de uma estranha inflamação, que se posicionava justamente no final de uma das linhas de suas mãos, formando uma bolha na palma de sua mão, quase se assemelhando à uma bola de cristal. Pediu à sua companheira de cela que tentasse ver o que se passava. Essa outra, analfabeta nos ardis da quiromancia, mas que era uma expert em adivinhações pela visão das bolas de cristal, observou com atenção a bolha na mão da amiga, onde vislumbrou uma projeção como num cinema, que revelavam as profecias que iriam ocorrer em breve. Abalada com a visão, entrou numa espécie de transe e êxtase espiritual, que se seguiram com crises convulsivas, desmaiando logo a seguir.

O Abaporu chegou ao aeroporto, com um sobretudo negro, botas enormes para alojar seus pés enormes e, para finalizar, cobriu sua diminuta cabecinha com um gorro. Apesar desse disfarce grotesco, conseguiu passar com tranquilidade pela nossa rigorosíssima alfândega. Pra variar, pegou um taxista mal-intencionado, que para ‘”tirar um a mais”, levou o Abaporu para um passeio por lugares turísticos como Penha, Ramos e Olaria, até “desova-lo” no bairro da Lapa. Já era noite e o bairro fervilhava de turistas, punguistas, cambistas, pugilistas, alcóolatras, mendigos, meretrizes, traficantes e transexuais. O nosso Abaporu achou aquilo tudo demais!!! Fazia um tempão, desde os bons tempos com a Tarsila, Oswald, Mário e Pagu, que não participava de um rebuliço igual aquele. Entrou num grupo de pagode e saracoteou se tremelicando todo. Foi então que avistou uma bela moça, fantasiada de índia. Lembrou-se das cunhãs de Macunaíma e partiu pra cima dela. A noite foi ma-ra-vi-lho-sa!!!

Pela manhã, Abaporu acordou bêbado aos pés dos arcos da Lapa. De súbito, lembrou de sua missão: livrar seus amigos quadros da tirania daquela velha senhora, esposa do tal marchand, que o escravizavam. Chegou à Copacabana, entrou de mansinho no apartamento, passando por sob a porta. Logo depois viu seu amigos aprisionados. pegou seu canivete para libertar seus camaradas. Escaparam sem deixar vestígios e se malocaram num esconderijo na periferia de Nova Iguaçu. A polícia do Rio procura por pistas.