sino igreja

O fantasma do sino

Foram precisamente doze badaladas. Uma após a outra, ressoaram madrugada adentro. A primeira à meia-noite em ponto. Após doze minutos, a segunda badalada, mais doze minutos, a terceira e, assim, sucessivamente, até às duas horas.

O ressoar estrondoso e repetitivo do antigo sino da capela rompeu o silêncio daquela madrugada gélida e fez estremecer as paredes do meu quarto. Acordei ofegante e amedrontado. Não consegui mais dormir. O antigo sino estava quebrado há anos e nunca se ouviu falar sobre qualquer ajuda para repará-lo.

Ainda me sentindo assombrado, mas impelido a saber o que estava acontecendo na capela, abri a porta. Uma névoa densa e intensa pairava sob a rua, não podia enxergar um palmo à frente. Recuei e fechei a porta. Inquieto, caminhei de um lado a outro da sala fazendo o assoalho ranger. Olhava para o relógio, o ponteiro parecia não se mexer. Voltei para cama, tentei dormir novamente em vão. O sino continuava a ecoar nos meus tímpanos. Fui até a cozinha, amenizei a sequidão da garganta, voltei para a sala e continuei a ranger o assoalho até meus olhos pesarem demais, então recostei no sofá e cochilei por um tempo.

Às seis horas em ponto, uma última badalada. Meu coração disparou, saltei do sofá e ainda com um gosto amargo na boca abri a porta. A névoa havia se dissipado, o céu, porém, estava manchado por nuvens de chumbo. Caminhei em direção à capela. Apertei os passos e ao chegar na esquina, avistei um aglomerado de pessoas na escadaria. Me aproximei e pouco a pouco ouvi o burburinho e o prantear das senhoras.

O padre estava morto. Fora encontrado pelo padeiro que estranhou a ausência do pároco, que há dias não ia buscar seus pães. Lá estava ele, jazia sob a cama com um semblante austero e um leve sorriso no canto da boca.

Não me furtei à curiosidade e subi com rapidez as escadarias até a torre do sino. O sino permanecia tão quebrado quanto antes, mas estava amarrado por um grande lençol branco com doze nós bem apertados. 

Retornei às escadarias da capela e indaguei pelo coroinha. Responderam-me que há um mês ele fora transferido para outro vilarejo. Desde então, o padre estava sozinho esperando alguém para lhe fazer companhia.