Aquela pombinha branca cantava o dia inteiro. O dia inteiro. A família já não sabia mais o que fazer, porque era um canto que mais parecia um lamento, um mau presságio. Vó Naná olhava para a avezinha e pensava “mal sabe eles que essa bichinha tá me chamando, que Oxalá tá me esperando, mas eu ainda não posso ir, não. Tenho que acabar de passar o que aprendi com minha mãe pro Jãozim”.
João, o neto de Dona Naná, tinha oito anos e passava o tempo todo com a avó, ouvindo suas histórias e tentando decorar todas rezas, receitas de banhos e chás. A senhorinha sabia que Jãozim, como ela chamava o pequeno, era ainda muito criança, mas ele era o único da família que tinha herdado o seu dom de seus ancestrais africanos, o da cura, o de acalmar as pessoas ansiosas. As vezes um coleguinha da escola estava chorando ou nervoso e bastava Jãozim chegar perto e dar um abraço ou sentar ao lado e contar uma das histórias que Vó Naná contava, que o amigo ia se acalmando e melhorava.
Ela sabia que seu tempo estava acabando, sentia seus sentidos meio confusos e os ossos enfraquecendo, mas, ainda não era tempo. Não agora. Não já. Ela olhava a pombinha branca cantando, a mensageira de Oxalá pedindo para ela seguir atrás dela, mas, ela dizia “só mais um cadim e eu já vou”. Os dias iam passando e avó e neto seguiam em suas longas conversas. Jãozim ouvia, aprendia e entendia como podia as coisas que a velha avó explicava.
Um dia, Dona Naná sentada na cadeira de balanço da varanda olhou para o quintal e viu o neto abaixado conversando com a pombinha branca que, finalmente, resolveu descer da árvore. A velha senhora levantou da cadeira, deu uma olhada demorada para a casa em que viveu sua vida toda, viu com amor a filha fazendo a canjica que ela gostava, as árvores, as flores, pegou suas guias que estavam na mesinha, pôs no pescoço e foi até onde seu neto, o herdeiro do seu dom, falava com um senhor alto, vestido de branco, que botou a pomba branca no ombro. Abraçou Jãozim e disse: “Agora tu tá pronto. Tá na hora de voltar para casa com meu pai.”
João chorou um chorinho sentido, olhou pra avó e disse baixinho: “Até um dia vó. Fico esperando a senhora voltar para me buscar quando for minha vez de voltar para casa.” O senhor vestido de branco, que era Oxalá, abençoou o menino pondo a mão em sua testa, pegou Dona Naná pela mão e, sorrindo, levou-a pelo portão afora.
A filha de Dona Naná encontrou a mãe caída no chão do quintal, sem vida, um tanto sorridente, segurando suas guias de Oxalá. Desse dia em diante, nunca mais a pombinha foi vista cantando. Sua missão acabou quando Oxalá veio buscar sua filha e abençoar seu mais novo herdeiro na Terra.
Amei!!!❤❤❤
Que texto lindo e emocionante!! 🥰🥰👏🏽👏🏽🗳️
Que lindo Rosa!, Gostei demais
Que lindo conto, Rosa!! Emocionada aqui!!! Parabéns pela beleza e leveza dessa partida.