Era uma linda noite de sexta-feira, o céu estava estrelado e uma bela lua cheia cintilante, brilhava sobre nós. Eu estava sentado na soleira da porta de minha casa com a minha namorada, observando a minha vó se balançando em sua cadeira, no quintal. Ela olhava fixamente para a lua, concentrada, e seu silêncio me incomodava, pois não era normal aquela atitude. Resolvi intervir na cena:
– Vodinha (era assim que nós a chamávamos), por que a senhora está olhando essa lua com tanta atenção?
– Meu querido, estou aqui lembrando de uma história de minha infância, que trago comigo há anos, sem compartilhar com ninguém.
Minha namorada, muito curiosa, não se conteve:
– Então vó, quem sabe não chegou o dia de contar?
– É minha menina, você tem razão. Essa noite lembra tanto aquele dia, que vou seguir o seu conselho e revelar esse segredo que guardo há anos.
Respirou profundamente e sem tirar os olhos da lua, começou a contar a sua história.
“Era uma noite de sexta-feira, não esqueço essa data, treze de agosto de 1909, eu tinha onze anos e já havia muitos irmãos nascido depois de mim. A lua pairava alta no céu, sua luz prateada banhando a paisagem e as árvores projetavam sombras alongadas, o ar estava carregado de eletricidade. O uivo distante de um lobo ecoava pela floresta escura, criando arrepios na espinha de quem o ouvia. Meu pai colocou as crianças para dentro de casa e o medo tomou conta de todos. A besta se aproximou da casa, suas garras arranhando a porta de madeira, tentando derrubá-la, gerando um pavor em todos os que estavam ali. Meu pai segurava uma espingarda, pronto para proteger sua família, enquanto minha mãe rezava em silêncio, olhando para a porta com olhos assustados. O lobo vendo suas intenções frustradas foi se afastando e os uivos ficando cada vez mais distantes, mal conseguimos dormir.
Na manhã seguinte, além dos arranhões na porta da frente da casa, encontrei algo no quintal: um tufo de pelos negros e grossos. Guardei comigo, como se fosse um souvenir, daquela noite horripilante.
Dias depois, o padre da vila veio jantar com nossa família. Ele era um homem alto, de olhos penetrantes, sobrancelhas grossas e voz profunda. Enquanto meu pai conversava com ele, eu o observava. Foi então que notei algo estranho: por baixo da manga da batina, um pelo muito parecido com o do lobo que eu encontrei. Meus olhos se arregalaram de surpresa. O padre era o lobisomem!
Desse dia em diante nunca mais voltei à igreja e guardei o segredo do padre lobo comigo, temendo que ninguém acreditasse em minha história. Mas toda vez que eu olho para a lua cheia, lembro daquela noite assustadora e do segredo que ela carregava.”
São memórias de minha vó, que hoje são minhas e que amanhã serão de minha filha.
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