O vestido já estava surrado, as cores já não faziam mais jus ao que aquela peça havia sido um dia. Ainda assim, Thereza ficava feliz em vestir a sua única roupa de sair. O destino era sempre o mesmo: a missa. Filha de um carpinteiro religioso – e rigoroso na mesma medida – a igreja era a única oportunidade de ir até a cidade, porque até mesmo as aulas eram lecionadas diariamente no próprio vilarejo, por uma professora que vinha todos os dias, com livros embaixo do braço.
A mãe falecera quando Thereza era muito nova. Pequena demais para lembrar de sua voz e seus trejeitos. Por isso, ela não teve alguém que lhe dissesse que o casamento é uma instituição difícil de ser gerida. E que, por esse motivo, as pessoas procuram constituí-lo por amor, já que dessa forma é mais fácil lidar com todas as suas implicações. Como ninguém lhe disse, e Thereza, aos dezesseis anos de idade, estava sedenta para se livrar das correntes que lhe prendiam ao pai, aceitou de bom grado se unir ao filho de um amigo de seu progenitor, vinte anos mais velho.
Castor era um homem rude – como seu pai. Só permitia que Thereza saísse aos domingos – como seu pai. Ela continuava lavando, limpando e cozinhando para dois. Mas eram seus novos documentos que a fizeram ter ciência da verdade: Thereza da Silva Pereira agora se chamava Thereza da Silva Moraes. O nome do pai havia sido trocado pelo sobrenome do marido. Foi apenas uma troca.
A casa era mais confortável que a anterior. Castor comprara algumas roupas para ela no brechó e as dividiu entre as peças de ficar em casa e as de sair, que só podiam ser usadas em festividades, como a Páscoa e o Natal. Thereza não gostou da divisão, mas não teve coragem de reclamar.
Em um dos muitos momentos de solidão, Thereza escreveu para a sua antiga professora, sem ter certeza se o endereço ainda era o mesmo. Ela lhe contou sobre o seu casamento e como tem passado seus dias. Também lhe confidenciou, como se fosse um pecado, o sonho antigo de ser professora infantil. Alguns dias depois, a professora respondeu: precisava de alguém para ajudá-la na escola, que agora lhe pertencia.
No teatro chamam de Deus ex-machina; os mais esperançosos chamariam de sorte; os céticos, de coincidência. Na vida, Thereza chamou de destino. A nova oportunidade seria a salvação que Thereza atribuíra erroneamente a Castor.
Naquele dia, mesmo em casa, decidiu vestir uma de suas roupas de sair. Tomou um vinho e ligou o som. Dançou, roçando os pés no carpete. Abriu o guarda-roupas, jogou as peças de sair e as de ficar em casa no chão. Em seguida, embaralhou-as. Agora não haveria mais distinção entre elas.
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