chapéu viking

Fator surpresa

Júlia ainda está sorrindo ao telefone quando Augusto abre a porta e a surpreende. De súbito, ela desliga o aparelho e, sem pestanejar, estende o sorriso até o marido.
– Oi amor!… Saudades!

Eles se beijam carinhosamente.
– Ao telefone? – Ele pergunta curioso.
– Sim… Mamãe! – Ela disfarça – Quer jantar?
– Depois… – Diz ele – Antes tenho uma surpresa maravilhosa! – Ele se joga no sofá.
– Qual? – Pergunta ela, atirando-se sobre ele.
– Lembra que queria ir para Búzios nestas férias?!

Ela diz que sim várias vezes, beijando-o repetidamente. Parecia uma menina feliz.
– Pois, então… Vamos amanhã!
– Amanhã???… Sério???…
– Sério!… Meu chefe liberou a casa de Búzios e poderemos ficar até duas semanas por lá!… – Explica Augusto, feliz com a alegria de sua jovem esposa.
– Que maravilha… Juninho vai adorar!
– Por falar nisso, cadê ele? – Indaga Augusto, percebendo a ausência do filho.
– Foi para minha mãe. Não te falei que ele iria para lá hoje?
– Ah, eles foram ao cinema?
– Sei lá!
– Como sei lá, Júlia? – Ele para e a olha sério.
– Você não estava falando, ainda há pouco, com sua mãe ao telefone?
– Sim… Mas não lembrei de perguntar… Nos distraímos fazendo fofoca da vizinha. – Ela dá um risinho cínico.

Augusto a olha desconfiado. Já a algum tempo vinha percebendo mudanças no comportamento da esposa, mas resolve não se preocupar com isso. Andava cansado demais… Devia estar fantasiando as coisas… Dá de mão e segue para o banho.

Lá no quarto espiando através da porta entre aberta Júlia sussurra a novidade a Romeu.

O dia amanheceu lindo! Augusto levantou cedo para ir buscar júnior na casa da sogra. Julia ficou dormindo um pouco mais, havia passado boa parte da noite fazendo as malas. Foi quando acordou e resolveu ligar para Romeu, aproveitando da ausência do marido, para se despedir do amante. Ela disse que não devia, mas Romeu insistiu muito para ir vê-la, se despedir:
–  Só para um beijo, amor. Coisa rápida! Um beijinho só!

O coração dela amoleceu. “Menos de dez segundos!” Derretida, ela pergunta:
-Só um beijo?
– Sim, amor! Só um. Juro!

Júlia sorri maravilhada e consente. Desliga o aparelho no exato momento em que a porta do quarto se abre e Juninho entra, seguido do pai. O menino abraça a mãe, feliz com a notícia da viagem.

Todos ansiosos e eufóricos começam a levar as malas para carro. Em pouco tempo tudo pronto para a viagem. Bagageiro espaçoso, pouca bagagem, Julia resolve, então, levar o patinete do filho. Pede a Augusto para ir com o menino na área de serviço buscar. Mal os dois adentram a casa e Romeu aparece do nada, com uma rosa na boca. Desesperada e feliz, ela grita baixinho:
– Seu louco! O que está fazendo aqui?

Ele ia dizer que viera beija-la quando ouviu-se a voz muito próxima do Augusto dizendo ao Junior para não esquecer o capacete. Sem pensar, Júlia o empurra para dentro do porta-malas fechando a porta com o coração aos pulos e diz fingindo pressa:
– Bora, bora! Estamos demorando muito para seguir.
– Calma, mulher! Só vou pôr o patinete no porta-malas…
– Não precisa! – Quase grita, desesperada – Deixa no banco de trás mesmo. O carro está vazio.

Augusto atendeu. Seguiram sem mais transtorno. Pista livre, Augusto e Júnior pareciam muito felizes. Só Júlia sofria silenciosa e desesperada. Não conseguia imaginar qual seria o desfecho de tudo aquilo.

A parada para o almoço aconteceu, mas há 200 km de casa e não havia possibilidade de Romeu voltar a pé de onde estava. Não levara dinheiro, cartão de credito, nem documentos. Cinco horas mais tarde, finalmente a família chegava em seu destino de férias. Júlia se apressou em colocar as malas fora do carro, antes que o marido se oferecesse para fazê-lo. Os três entraram na casa, ansiosos para conhecer o ambiente. Júlia nem tanto. O que ela buscava era um lugar seguro onde pudesse esconder o amante. Descobriu que além do quarto de hóspede havia um outro, o de dependências de empregados, e foi para lá que ela arrastou Romeu enquanto Augusto tomava banho.

A noite fora longa. Júlia acordou várias vezes, sobressaltada, o marido e o amante embaixo do mesmo teto era loucura demais.  O dia amanheceu. Radiante, Júnior invadiu o quarto gritando que queria ir para praia. Na cozinha, Augusto já prepara o café da manhã. Todos animados. Só Júlia padecia no seu martírio particular. E assim se seguiram as tão sonhadas semanas de férias! Júlia alimentava Romeu nas madrugadas. Banho só quando a família deixava a casa para alguma diversão. O pavor dela aumentava junto com a animação do marido, que desejava negociar com o patrão mais uma semaninha no “paraíso”. Uma manhã, Romeu deixou cair a xícara de café. Teve de convencer a todos que havia ratos na casa. Foi um sufoco…  Noite passada, Júnior correu assustado para a cama dos pais, dizendo haver fantasmas na casa e que ele, o fantasma.
– Ainda bem que amanhã já vamos embora! – Pensou Júlia alto demais. Augusto a olha sem compreender.

Já no carro ao lado do marido, agarrada ao terço, Júlia agradecia a Nossa Senhora Protetora dos Adúlteros pela graça de ter sobrevivido até ali, quando em uma blitz, soldados mandam encostar e pedem os documentos. Julia desata a chorar. Augusto olha para mulher, confuso. Os guardas se entreolham desconfiados e pedem para deixarem o veículo e começam a inspecioná-lo.

E pronto. Foi só abrir o porta-malas para Romeu saltar gritando:
– Eu não tenho culpa de nada, não tenho, eles me sequestraram.

Resumo da história… Foram todos liberados após prestarem esclarecimento ao delegado. O fato, engraçado para uns, inacreditável para outros, correu rápido. Na porta da delegacia já havia dezenas de pessoas com chapéu de viking tirando sarro do coitado. Foi quando ele teve a ideia de deixar o local no porta-malas do próprio carro. Já o amante, foi ao volante.