Eu caminhava calmamente pelo calçadão. Era um dia daqueles de um azul só. Céu e mar pareciam casal em lua de mel fugido de uma pintura feita pelas mãos talentosas e desconhecidas de um artista de rua. Eu estava despreocupada, de folga no trabalho e todo o tempo era meu, sem cobranças, nem prazos e nem preocupação nenhuma, em um momento de contemplação desses que existem apenas para nos mostrar que viver é um privilégio.
A praia estava limpa e a areia clara não escondia nenhum detrito deixado por algum banhista intencionalmente descuidado. Não havia filas nos chuveirinhos e os quiosques reuniam gente fina, elegante, sincera e muito bonita. Rostos sorridentes que nos faziam imaginar que a noite anterior, na Rua do Ouvidor, de tão agradável havia escapulido dos ponteiros do relógio e amanhecido, se espichando até a tarde do dia seguinte, sem dor e sem pudor nenhum.
Meu pagamento havia acabado de entrar na conta e com valor dobrado. Depois de anos aguardando uma melhor colocação no trabalho, ela havia finalmente sorrido para mim um mês antes. Eu continuava caminhando, e à minha frente, as ruas estavam livres. Presenteei-me com um belo almoço à beira mar e caipirinha de morango. Até a brisa fresca era melodia suave, de uma canção que eu nunca tinha ouvido.
Sem a pressão da rotina, minhas mãos estavam suaves e meus cabelos e unhas perfeitamente feitos, o que para qualquer mulher pode-se definir como paz. Meu carro recém-comprado, embora ainda cheirasse a novo, ficou estacionado pois não pude recusar a carona de um belo par de olhos cor de avelã. Que homem! Seu sorriso iluminava a praia inteira. Não lembro o seu nome, mas sua doçura podia ser sentida antes mesmo de nossos lábios se tocarem. Eu sorria e ele segurava as minhas mãos prometendo me deixar em casa em segurança..
A conversa que apenas começava foi interrompida pelo som estridente do despertador. Abri os olhos preguiçosamente indignada. Era hora de trabalhar. Pensei em dormir mais cinco minutos para finalizar meu devaneio descabido. Por que acabou? E depois? Não consegui dormir e nem descobrir o final do sonho. Sentei-me na cama e enquanto os meus pés tocavam o chão, constatei dolorosamente que o depois do fim na grande maioria das vezes não acontece. Fiquei pela metade e despertei.
E depois?
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