uvas

A uva viu o vovô

Vovô Heróclides era um grande apreciador de vinhos. Não chegava a ser um sommelier, mas sabia distinguir perfeitamente a qualidade desse maravilhoso néctar criado por Baco, ‘o Deus do vinho’.

Certa feita, ele foi convidado por um amigo de infância, dos idos de Renato e Seus Blue Caps, Wanderléa, Wanderley Cardoso, Jerry Adriani e Roberto Carlos. Esse amigo tinha uma casa de veraneio no Rio Grande do Sul, próximo a divisa com Santa Catarina, para numa incursão, conhecer os vinhedos das serras gaúchas. Ele, claro, ficou esfuziante com a ideia.

Partiram dois dias depois com gostos de Malbec, Merlot, Pinot Noir, Cabernet Sauvignon no pensamento e nas línguas, já que durante a espera, no Galeão, degustaram algumas taças, porque até chegar no Aeroporto Salgado Filho, teriam que tirar os pés do chão por mais ou menos duas horas, além de furarem as nuvens que causavam muitas turbulências e eles morriam de medo de voar, porém eram movidos pela ansiedade de chegar em Gramado, Canela, Bento Gonçalves…

Quando desceram em Porto Alegre, estava começando o caos. O rio Guaíba, com a ajuda e a força de seus afluentes, estava revoltado com o descaso dos homens e ‘vomitava’ sua revolta na capital e em outras cidades, inundando tudo. As serras gaúchas, o grande reduto dos vinhedos, sofria com desabamentos das encostas e alagamentos nas plantações das parreiras.

Vovô Heróclides pediu perdão a si mesmo por estar frustrado em não conhecer os vinhedos, diante de tanta tragédia, enquanto o povo gaúcho perdia vidas e bens. Ficou refletindo sobre o que estava acontecendo e acabou permanecendo mais um pouco no estado, com o intuito de auxiliar nas ajudas e confortar aquelas pessoas.

Na hora do seu jantar, já na casa do amigo que não sofrera com as inundações, havia junto com uma garrafa de vinho francês, um cacho de uvas ainda molhadas após o asseio. Vovô Heróclides ficou olhando para aquelas uvas que pareciam fita-lo, tristes. Seus olhos encheram-se de lágrimas. O vinho já não tinha o mesmo sabor.