Alberto era o estereótipo do homem bem-sucedido. Mansão, casa de luxo, andava acompanhado das mais belas modelos, alto executivo. No trabalho, nenhuma decisão importante era tomada sem ouvi-lo.
Betinho vivia trancado há mais de trinta anos. Escondia-se no breu da existência, no limiar do quase esquecimento, somente observando os caminhos de Alberto.
No começo, ainda se encontravam com alguma frequência, andavam de mãos dadas, sorriam juntos. Com o tempo, não era mais procurado. Começou a se deparar com a porta fechada, depois trancafiada, era contido por mais de dez tipos diferentes de cadeados.
Constatou que o sorriso de Alberto desaparecera. O homem de negócios não encontrava mais graça nas múltiplas formas das nuvens. Tampouco ficava encantado com os caminhos das gotas de chuva bailando sinuosas pelas irregularidades das paredes. Buscava o pôr do sol apenas para o material publicitário da empresa, como quem pretende vender toda a beleza que não é mais capaz de enxergar. Até a comida era fonte de ostentação, não de prazer. Degustava os doces mais requintados e sequer se lembrava do bolo de laranja, com raspas de limão, que comia em São Lourenço, no sítio de vovó Xica.
Quando o câncer levou mamãe Tereza, Betinho ficou muito triste. Em seguida, sentiu uma emoção diferente, não podia acreditar no que seus olhos viam: Alberto resolveu visitá-lo. Trocaram um abraço apertado. Choraram juntos, riram juntos, relembraram muitos lugares. Sentiram o joelho ralado na partida de futebol. E sentiram o beijo carinhoso, acompanhado do olhar doce de Tereza, que sempre dizia:
– Antes de casar sara!
Seus olhos encheram de lágrimas e seus rostos foram iluminados por um riso salgado e molhado. Ali Betinho viu Alberto sorrir pela última vez.
Nos dias que se seguiram, Alberto decidiu se fechar definitivamente. Afinal de contas, seu passado estava morto, igual a sua mãe, e assim deveria permanecer.
Antes de desaparecer para sempre, Betinho mergulhou numa tristeza imensa, mas não por causa de si mesmo. O menino verteu o choro por Alberto, uma vez derradeira. Percebia que, dali para frente, não estaria mais ali para ajudá-lo e sabia, melhor do que ninguém, o quanto seu adulto precisava de ajuda. Afinal de contas, onde as pessoas viam um case de sucesso, o garoto enxergava, apenas, um caso perdido.
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