taxidermia

Eternamente

Ela era mais que uma fã. Era obcecada! A taxidermia era sua vida. Virara fã desde pequena, quando tinha visto, na sessão da tarde, um guaxinim parado, olhando fixamente para a frente.  Ela havia perguntado ao pai se os bichos também sabiam brincar de estátua. O pai rira e explicara a técnica com palavras fáceis para que ela pudesse entender sobre a taxidermia. Achara fascinante o animalzinho estar sempre ali com seu dono. 

Como ela aprendera a ler cedo, lia tudo que encontrava sobre a técnica no google e baixava várias fotos. As palavras que não entendia, perguntava ao pai que prontamente respondia. Ele se enchia de orgulho pela inteligência da filha! Ela era sua obra prima! 

Perdera a mãe cedo e seu pai era tudo o que tinha, era seu ídolo! Homem solitário, culto, rico e vivendo de dividendos. Dizia que tudo que precisava era de sua garotinha. 

Ela foi crescendo e seu interesse foi aumentando. Os pré-adolescentes só queriam saber de música e de Facebook, mas ela queria ver vídeos de embalsamar. Só falava sobre isso na escola. Contava suas descobertas aos professores que eram os únicos que a escutavam. Os colegas de classe a acham biruta, papo nada a ver, se afastavam dela e a apelidaram de “Empalhada”. Ela não ligava…até porque empalhar e taxidermizar não eram a mesma coisa…bando de boçais!… 

Tornara-se o membro café com leite do laboratório de taxidermia da Unicamp graças ao seu professor de química do ensino médio que também trabalhava na Universidade e mexera alguns pauzinhos. Ela tinha futuro… 

Já sabia que só podia fazer a técnica em animais vertebrados. Tinha montado clandestinamente, com a ajuda do pai, um pequeno e improvisado laboratório no porão de casa. Furtara uma coisa aqui, outra ali do clube de taxidermia…ninguém sentiria falta mesmo! Começou suas próprias experiências com aves e gatos da vizinhança. Depois, foi ganhando confiança e ampliando. Seu pai a achava brilhante. Ela era sua obra prima! 

Passara com louvores pra Unicamp e finalmente se tornou aluna oficial do laboratório e a melhor dentre todos. Nem na faculdade fizera amigos. Enquanto jovens organizavam festas, se reuniam em bares ou namoravam depois das aulas, ela lia e escrevia sobre taxidermia. Foi a primeira aluna do 1° ano a ter um artigo sobre o tema publicado na revista eletrônica da faculdade. 

Não ficou em nenhuma república. Ia e voltava para casa, para o seu pai e contava seus feitos diários para ele. Como poderia deixa-lo só? Ele se sacrificara durante toda a vida para criá-la sozinho. Dera incondicionalmente o seu amor. 

Por isso, chegava em casa todos os dias, beijava-o na testa, tomava um banho e comia em frente a ele, dizendo tim tim por tim tim tudo que tinha feito. Era maravilhoso saber que ele estaria lá, eternamente, sentado em sua cadeira preferida com os mesmos olhos do guaxinim que ela vira quando criança. Agora, ELE era sua obra prima!…