comício Getúlio Vargas

Causo de fantasma

– Oi!?… Olá? … Tudo bem? Kkkkkkk (risos sem graça)! A noite está linda, né? E cá estou eu, para a minha caminhada habitual… Pronto para mais uma rodada de baralho com os amigos; duas ou três cervejinhas… Com a permissão dos médicos, quase medicinal, kkkkkkkk (mais risos)! Nossa! Lá vem aquela moça de novo com aquele maldito cachorro, que late ferozmente quando me vê!… E a moça, não faz nada, fica com aquela cara de paisagem… Ah! Detesto cachorros!

Mas, mudando de assunto, deixe eu te contar um causo!… Que me veio à memória, ainda há pouco… Quando descia o elevado encontrei o meu filho caçula, conversando com dois amigos no rol de entrada. Eles falavam sobre Waldomiro, o vizinho do quinto andar, que fora preso pela manhã… Acusação? “Funcionário Fantasma” de uma repartição pública… E isso me levou láááá, no inicio dos anos 30”… Kkkkkk… Governo de Getúlio Vargas. Eu, ainda menino, calças curtas, lembro-me de um bebê que nascera na vizinhança; o burburinho que corria, à boca miúda, era de que a criança era uma aberração! Tão feio que os pais o escondiam dentro de casa… Só a família e a parteira conheciam a criança… E essa, toda vez que falava da criatura, fazia o sinal da cruz! Kkkkkkk… Por favor, não me entendam mal, não! Só de cometer bullying, como falam hoje em dia, mas permita-me continuar a prosa… A criatura, coitada, teve muitos problemas de socialização… É claro que a aberração, digo o monstrinho… Quero dizer, aquela criança recebera um nome ao nascer. Osório, mas, todos o identificavam pela  alcunha “Criatura!”… Mas, voltando o que eu ia dizendo… Na escola, na vizinhança, na própria família… E, quando chegou, adolescência, a Lei de Murphy, não se fez de rogada; não tinha grupo de amigos, trabalho, namorada, paquera… Nada vezes nada!

Onde chegava as pessoas criavam uma fórmula mágica de desaparecer; davam um jeitinho de evacuar o lugar… Um ouvia a mãe chamar!  Outro; lembrava da lição que não concluira; outro era tomado de súbito por uma enxaqueca terrível! Kkkkkkkkk, isso já lá pelo meado de 47… Lembro que Dutra ainda estava no poder. Quando os municípios começavam a se preparar para eleger seus vereadores… No nosso município, dois partidos importantes brigavam pela preferência dos eleitores; de um lado, UND, e partido de oposição ao governo… Do outro lado PSD, partido da situação! A briga estava ferrenha! Foi quando um dos candidatos teve uma ideia, fantástica! Contratou Osório, a  criatura, para esvaziar o comício do candidato adversário. Ele chegava, assim como quem não quer nada, dava um sorriso, estendia as mãos,
oferecia um abraço, um caloroso bom dia! E pronto! Os militantes disfarçadamente iam enrolando as bandeiras, recolhendo as faixas, se afastando, fugindo assombrados. Por muitas vezes pagou Osório para dar umas voltinhas nas praças. Feroz, vestindo apenas a camisa do adversário. Não demorou muito o PSD, partido da situação, percebeu a marmota e partiu para o contra-ataque e passou a contratar os serviços de Osório também kkkkkkk (riso)… Era uma confusão só! Os eleitores já estavam ficando loucos!

Pela manhã, Osório vestia uma camisa dizendo: Vote em Elias pela a alegria UND! À tarde, ele exibia uma outra: Para que haja fartura vote em Farrula, PSD! Logo a cúpula do governo se reuniu e tomou a decisão de nomear a criatura, digo, o Osório para terem exclusividade na divulgação. No seu primeiro dia de trabalho na repartição, criou alvoroço. Dona Margarida, a secretária, enfartou… E a recepcionista desenvolveu síndrome do pânico!… Foi quando, de novo, os gestores tomaram outra decisão: Osório continuaria funcionário, e exclusivo, mas não seria necessário comparecer ao local de trabalho, bastaria ir uma vez no mês assinar a sua folha de ponto. E toda a vez que algum funcionário, desinformado, pegava a sua ficha e, curioso, perguntava:
– Quem é esse tal de Osório Martins, que eu nunca vi?

Outro alguém respondia:
– É o fantasma! O funcionário-fantasma!