Tem dores que ninguém ensina a sarar. Só o tempo e a experiência, em alguns casos, suavizam os sintomas ou são o remédio para a cura.
A cãibra, por exemplo. Passei anos sentindo aquele misto de dor, contração muscular, sensação de impotência que me acordavam sobressaltada no melhor do meu sono. Nunca achei que poderia morrer de cãibra, mas fui aprendendo a lidar com ela. Usei muito unguento para massagear e aliviar a dor. Hoje, apenas viro o pé em sentido contrário ao que a contração me forçava a virar, mantenho por alguns segundos e do nada passa.
As dores de Maria de Lourdes começaram durante a pandemia. Perdeu emprego, marido e filho em consequência da covid-19. O isolamento a que se vê obrigada a cumprir por ter tido contato com os falecidos quando ainda estavam doentes apenas colabora para que sua dor aumente. Nunca imaginara que a solidão doesse tanto! Angustiava tanto! Muito mais que uma cãibra. E para Maria de Lourdes não bastaria virar o pé para o lado contrário. Não ia passar. Só poderia recorrer ao tempo que, talvez, lhe desse a experiência para superar e curar-se daquela angústia que a solidão lhe causava.
Apesar da dor, seu íntimo ia se nutrindo de esperança. Porque o ser humano parece ser movido por esperança. Não sei explicar essa força e energia contidas nessas quatro sílabas: ES-PE-RAN-ÇA. Sem ela não há força do pensamento que dê jeito. O bom é que ela é muito difícil de se apagar. Quando pensamos que não, lá vem ela reacendendo, (re) iluminando, recarregando as forças da pessoa. E no brasileiro parece que ela é mais potente. O povo daqui pode passar fome, estar desempregado, ser oprimido, humilhado, vem a tal esperança e resolve tudo. Ou quase tudo. E naqueles momentos difíceis pelos quais estava passando, Maria de Lourdes se nutria dela. Tinha esperança de não precisar ser internada, da chegada de uma vacina eficaz, de ter sua dor amenizada… E novamente aquela luzinha começava a brilhar dentro dela: “Quando a pandemia passar eu quero ter alguém perto para poder abraçar”.
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