O seu vulto simplesmente perpassou diante de mim, diáfano e etéreo, espalhando um cheiro suave no ar estimulando meus instintos sensoriais; o odor daquele perfume era tão exclusivo dela, tão misteriosamente próprio dela, que ainda o sinto grudado em minhas narinas, bem assim como, em meus olhos sonolentos, a imagem do seu semblante sempre tão fugaz, mantendo aquele mesmo jeito de quem nos olha de través – fitava-me através de minha cara, de meu corpo, da minha alma, e de tudo o mais que me compõe como ser, transparecendo, de fato, não se importar com porra nenhuma que não venha da sua, digamos, natureza bélico-angelical… Sim, num jeito próprio de me amar e se deixar amar tão displicentemente, como se fosse a melhor de todas as psicólogas ao soltar um palavrão: “Ah! Tem sido muito bom estar contigo!!!, mas, nas próximas vezes, tente melhorar os seus estímulos sensoriais… necessito sugar bem mais de seus pensamentos mais secretos… pense em como pudesse fazer uma mãe plenamente feliz, como ela mereça… e deixe de ser um bebê chorão!”.
Nem sei bem ao certo se foi ela que me disse isso ou estou inventando. Acho que, no fundo mesmo, ela nunca tivesse me dito nada disso, apenas me observara daquele mesmo jeito de me olhar, de me enxergar através das mentiras e das vaidades e de seguir às pressas, meio que se recompondo de suas próprias instabilidades existenciais, se resolvendo com os panos do vestido balançantes em seu torso ereto, porém elegantemente trançados, em direção ao seu toucador a se esborrifar daquela sua poção a base de lavanda, ou quaisquer essências fossem ali misturadas; algo como uma fórmula mágica que inebria e entorpece. Guardo em minhas lembranças a imagem daquela nuvem de vapor perfumado a lhe envolver e empestear geral, processando as minhas ilusões mais infantis, como se eu fosse um viciado e estivesse em plena noia, refém de seus desejos mais sórdidos, embora jamais os tenha confessado… É! Creio mesmo que faria qualquer coisa pra tê-la sempre ao meu lado, mesmo sabendo que “o sempre” costuma durar muito pouco, pois a desgraceira da vida vem logo mostrar a sua face perversa e perdura até o dia seguinte… a noite seguinte… ou enquanto dure os últimos sintomas do meu vício.
Talvez nem fosse aquele anjo mera ilusão de ótica; ou, quem sabe, fosse eu a imagem refletida do seu pensar?! Algo que tenha permanecido gravado em objetos banais ou em paredes nuas e cruas… e… frias. Ok, talvez sejam somente ilações retóricas essas minhas e não exista nada lá nem cá! Fossemos como reflexões de pessoas simplórias e tão carentes de tudo; quando até mesmo uma simples foto antiga daquelas do tipo “de Polaroid”, num domingo das mães, com família reunida e tudo; fosca e amarelada, ainda que emoldurada, repousando sobre a velha cômoda, nos cobre íntimas confissões e acabem provocando confusões mentais num velho solitário e saudoso coração.
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