família discutindo

Curso de férias

Professor Leopoldo, olha a turma do curso de férias! Lo-ta-da! Sorri. 46 de magistério e ainda se emociona com a sede de saber do ser humano. Aposentado há 15 anos mas, há 5 voltara às salas de aula com uma nova proposta! Discutir a apaixonante tecnologia com os seus apaixonados. A princípio acharam loucura! Imagine convencer um bando de adolescentes a abandonar suas férias para discutir as vantagem e desvantagem da tecnologia com alguém do século passado! O Professor Léo, como era conhecido, inicia a aula cumprimentando a turma, em seguida passa a ler um texto. O texto aborda a história de uma família dividida há gerações. Alguém muito rico, abandona família e toda a sua riqueza em nome de uma paixão por um outro alguém muito pobre. Laços foram rompidos. E no interior de um estado vizinho, a parte pobre da família cresceu e se multiplicou, habitando a área rural de uma isolada cidade. Essa parte da família vivia apartada da tecnologia. Já a outra parte, “a rica”, vivia em arranha-céus, na capital de um próspero estado! Após décadas, a matriarca desta família, do lado rico, pede, como presente pela passagem de seu centenário, um passeio:
– Quero ir visitar a banda pobre da nossa família.

Houve resistência, discussão, mas acabaram por atender ao pedido da anciã. Afinal, quem teria coragem de negar a um pedido que poderia ser o último? E foi! A imponente Aurora falecera aos 100 anos. Dois dias após chegar em Cordel! Uma cidade pequena incrustada no Kichochó do Norte, conhecida pela produção de bananas e mel de abelhas. O lugar tinha luz elétrica, é verdade; a partir de um gerador que armazenava eletricidade advinda da cidade vizinha. Internet? Tinha. Fraca e ruim, quando o gerador permitia. Mas, foi lá em Cordel que a banda rica da família teve que velar a senhora Aurora! Esse velório finalmente uniu as duas bandas: eram tios, primos, sobrinhos; um punhado de gente… Uma população de familiares e parentes que sequer sabiam que existiam. Entre lágrimas e pesares a família se integrou. E o Doutor Castro, agora “O” patriarca, diz em tom solene:
– Quero que venham todos residirem em Vieira! Não é admissível as condições que sobrevivem.

Ao ouvir tal absurdo o Senhor Alfredo, patriarca da banda pobre se levantou:
– “Pera ir!”, meu rapaz! Quero lhes fazer este mesmo convite… Abandone a selva em que vivem e venham!… Aqui há espaço para todos!

Uma gargalhada coletiva interrompe a narrativa… O professor ergue a sobrancelha sobre o óculos e olha a turma com ar inquiridor. Igor, um jovem de 16 anos, fala:
– Cara! Que louco! Podendo morar na capital preferir um lugar que nem internet tem!
– E pior! Quer levar os outros para o sofrimento também! – Completou Mônica o discurso do colega!
– Não é bem assim! – Disse Guto, outro aluno – Existem muitas vantagem em morar na zona rural de uma cidade… Segurança, saúde…
– Para com isso, Guto! Essas vantagens que você cita a tecnologia já garante dentro das grandes cidades. – Diz Nando.
– É verdade, Guto, ele tem razão! Viram ontem? Um sistema implantado no Banco Central desmantelou um esquema de desvio de dinheiro público, que sem o auxílio da tecnologia estaria funcionando até agora! – Disse Júlio, com ar intelectual.
– E quanto à saúde? – Patrícia saiu do fundo da sala para engrossar o caldo. – A tecnologia tem dado show! Tratamentos avançados que estão trazendo cura para doenças que antes eram mortais! Gente! Na moral? A inteligência artificial tem salvado o mundo!

O professor, de braços cruzados, assiste com um sorriso bobo nos lábios.
– O que vocês não entendem é que parte da solução que tecnologia cria é para sanar os problemas que ela mesmo causa e a outra parte ameniza um problema agora, mas causa efeitos colaterais ainda piores no futuro! Isso é “burrice artificial”! E vai acabar com o mundo! – Explode Guto!

Professor Léo resolve intervir:
– Pessoal estou adorando o nosso debate! Vamos fazer uma coisa? Quem concorda com Guto passa para o lado esquerdo e quem concorda com Igor, fique do lado direito.
– PROFESSOR LÉO! – Gritou Guilherme – Eu acho que os dois tem razão! De qual lado eu fico?
– DO DE CIMA DO MURO! – Gritou Júlio, e todos caíram na gargalhada.

O Professor esperou passivamente a algazarra findar para organizar uma espécie de gincana… Tecnologia versus antitecnologia. Começou pelo lado direito com Igor alardeando os avanço da tecnologia na medicina. Como réplica, Guto falou das doenças conhecidas como “Mal do século XXI”. Depressão, ansiedade, síndrome do pânico, obesidade… Foi nessa hora que Mônica voltou a falar:
– Nem venham culpar a tecnologia pela obesidade! Graças a ela a minha vizinha, que era gorda como uma porca, perdeu 30 quilos e hoje veste manequim 38… Uma lipoaspiração a transformou da noite pro dia!
– É! A minha prima não teve essa sorte! – lastimou Bia, que ocupava o lado esquerdo e ainda não havia aberto a boca.
– O que houve com ela? – Perguntou o professor.
– Teve infecção generalizada e morreu!
– Ah! Mas aí, estamos falando do mau profissional… Fatalidade! … E não da tecnologia! – defendeu Fernando!
– Não! – Diz Guto! – Estamos falando de elevadores; tecnologia que impede de subir dois lances de escada, mesmo quando não carrega pacote algum. Estou falando da escada rolante que você usa, mesmo quando está sem pressa, passeando no shopping… Os fast-food que come todos os dias para não cozinhar. E assim a tecnologia te engorda, para que você precise dos seus “maravilhosos recursos tecnológicos” para emagrecer… São pulseiras, pingentes, injetáveis, adesivos e cirurgias.
– Mas, há escolhas! – Diz Paty – Tem pessoas que fazem exercícios em academias para manter o peso. Eu mesma sou uma dessas… Estou até com um pouco de dor nas pernas do exercício… Só não tá mais por causa do relaxante muscular que tomei.
– Está vendo! As pessoas que vivem no campo se exercitam naturalmente e não precisam de analgésicos – Retrucou Guto.
– E ainda tem um bronzeado maravilhoso! – Ariscou Priscila em dizer.
– Mas o bronzeado eu consigo no shopping, em meia horinha! – Alega Paty.
– E um câncer de pele alguns anos depois – Disse Guilherme, já se posicionando.
– Não se preocupe, Gui, a tecnologia ira curá-la, se isso vier acontecer, né Paty?- Gustavo ironiza.

Satisfeito com o sucesso de sua metodologia, nada tecnológica, diga-se de passagem, o Professor pede a palavra e brinca dizendo estar igual ao Guilherme, “em cima do muro”, e todos riem. O mestre explica então que essa dinâmica tem a finalidade de chamar a atenção para a relação do homem com a tecnologia. Os recursos tecnológicos foram criados para servir ao ser humano, e que, jamais, em tempo algum, aconteça o inverso! Oxalá não permita que a inteligência artificial um dia se torne o marco da burrice humana. E que assim seja, amém!