Nove meses. Os pais, um engenheiro, e a mãe, uma matemática, estavam esperançosos pelo breve nascimento do filhinho querido. Haviam planejado quase tudo, mas só esqueceram de combinar com o seu futuro filho. Próximo à data marcada do parto, um anjo etéreo e safado penetrou para dentro do útero e bateu um papo com o feto. O anjo chegou cambaleando, fumando um charuto, e numa das mãos segurava um copo de whisky. O anjo torto perguntou ao feto: “- Você tem certeza que quer sair daqui? Tão quentinho, tão confortável… tem certeza?” O feto meneou a cabeça, mostrando que não sabia responder. Então o anjo sacou um tablet e disse que iria mostrar à ele o que ele iria ver caso saísse de seu confortável aposento. Mostrou ao feto na tela do tablet, as últimas reportagens do mundo e das cidades. Guerra na Ucrânia, crimes, traições, tramas, intrigas, ameaças, ódio, ganância, impaciência, sangue rolando…
O feto, já desesperado com as imagens vistas no tablet, pediu pro anjo torto sair de seu ninho, pois para ele já era demais tudo aquilo… Resolveu que não iria sair dali. A mãe, sem saber de nada, aguardou com ansiedade as contrações, que logo apareceram. O feto resistiu bravamente e não saiu. Diante das horas que passavam, os médicos resolveram partir para a cesariana. Mas até diante das investidas dos bisturis dos cirurgiões, o bravo feto, logo após as incisões, reagia fechando o tal buraco. Sem saber o que fazer diante do inusitado, os cirurgiões deram-se como vencidos. E disseram à mãe que a ciência não teria como solucionar aquela situação. Após o desespero inicial, a mãe aceitou a situação de ser uma “mãe impossível”. A mãe então cultivou a partir de então aquela barriga de gestante, sabe-se lá até quando. O tempo foi passando e, limitado de nutrientes, o feto continuou do mesmo tamanho, na sua vidinha restrita, e refletindo sobre o medo de sair de seu conforto eterno, e se a escolha de seus pais teria sido de fato correta.
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