mulher idosa espelho

Alethéa

Três da manhã. Alethéa abriu os olhos, levantou-se e andou até o espelho vertical da porta do armário, situado à direita de sua cama, perto da
janela. Olhou no espelho e, de repente, já não se recordava porque estava lá. Contemplou sua pele branca, os olhos claros, o cabelo liso e escorrido, como quem procurasse qualquer significado em sua atitude incompreensível.

Mais um pouco de tempo e percebeu que o motivo de estar lá, no meio da madrugada, estatelada diante do espelho, já não era a única coisa da qual não se lembrava. Observou o armário, os móveis ao redor, o seu quarto como um todo e não reconhecia o local onde estava. Parecia até que não era aquele o lugar onde se deitava sozinha nos últimos dois anos, seis meses e treze dias de sua vida.

As memórias, uma após a outra, foram sendo subtraídas de sua mente como uma casa, desprotegida nas férias da família, submete-se vulnerável à ação de hábeis furtadores. Nesse caso não podia afirmar quem, ou o que, estava levando embora todas as suas memórias. Entretanto, o fato é que, em pouco tempo, já não se recordava de mais nada.

Lembrou-se somente de fechar os olhos e encontrou apenas uma última verdade: nada lembramos do antes ou do depois desse breve momento chamado existência.